sexta-feira, 19 de novembro de 2010

GARIMPOS DA MEMÓRIA.


      Era um ermo no meio do nada ( Latitude 26° 22´ 13'' Sul – a uma longitude 50° 08' 40'' Oeste. Altitude: 788m. ) Apenas a vegetação silvestre: Imbuias medindo até 12 metros de circunferência, Araucárias com 60 polegadas de diâmetro, Cedros centenários, Gabirobas carregadas de frutos de sabor indescritível, Ipê amarelo que os nativos chamavam de Caróva. Essa árvore quando floria formava um gigantesco buquê amarelo, beleza para se guardar para sempre na retina e na alma...O taquaral povoado de borboletas azuis com asas de até 20 cm de envergadura cintilando seu neon ao voar entre as folhas secas nas tardes do outono, dava pra se imaginar um santuário da Natureza, naquele cantinho de Santa Catarina.
      Surge um casebre, feito com tábuas lascadas de Araucária lavradas a machado; um pequeno quarto contem uma cama feita em varas trançadas com cipó no estilo fundo de jangada; cozinha de chão batido. O fogão é uma trempe de ferro sobre o fogo de lenha em brasa. Sobre a trempe uma pequena frigideira para fritar ovos e uma panela pra cozinhar batatas e ao lado, um tripé de barra de ferro também sobre o braseiro serve de suporte para se pendurar um caldeirão com o feijão e outras iguarias para serem cozidos.
      Anoitece. A tênue luz da lamparina ilumina o ambiente. O silêncio é quebrado por palavras de amor do homem, e da mulher; ele se queixa do cansaço pela faina do dia, e ouve dela a concordância, exausto, deita a cabeça sobre seu colo e adormece, ela o acaricia até adormecer também. O silêncio é solene...
      Entre as árvores, corre ligeiro um arroio de água cristalina sobre o leito de pedras, água pura vinda da serra cuja vertente fica a uma légua morro acima. Pouco abaixo o arroio cai em cachoeira de alguns metros de altura. A queda d água forma um poço onde a água faz um redemoinho, ao lado, pequeno remanso com alguns peixinhos que quando vêm a superfície comer frutinhas que caem das árvores existentes á margem, o Martim Pescador que está a espreita, num vôo rápido e rasante consegue pinçar um a um até se fartar.
      Para os nativos, o barulho contínuo da cachoeira com a margem sempre florida, soa como música quebrando a eterna quietude. Tudo é paz.
      Ali cheguei pelas mãos de uma curiosa que sabia-se nunca ter saído daquelas masségas siquer  para ir ao povoado que distava dali menos de trinta km. Curiosa é como eram chamadas as parteiras que exerciam essa função sem nenhum conhecimento médico mas que funcionava bem.
      Foi nesse local, a passagem de meus primeiros mil dias.
      Ao final, não mais um ermo no meio do nada... O que me houve nesse período, não saberia relatar. Só Gabriel Garcia Marquez o faria. Isso até me inspira Zilá da Costa Mamede em Soneto Triste Para Minha Infância; Assim diz ela na primeira estrofe: "De silêncio me fiz, e de agonia vi, crescente, meu rosto saturado, tudo de mágua e dor, tudo jazia nos meus braços de infante degredado".
      O lugar foi chamado Rodeiozinho, próximo a então Distrito  de Papanduva que pertencia ao Município de Canoínhas.
      O tempo, mestre dos sábios levou-me lentamente a entender que Deus havia colocado este Seu filho no meio de tudo; A Natureza e suas dádivas! Eu era amado, e não sabia...
 

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